quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Eu tenho o sexto sentido, e você?

Diz por aí que o ser humano tem cinco sentidos. A professorinha faz a gente decorar isso religiosamente. Pois isso é uma grande besteira. Todos temos seis. EU DISSE 6 (meia dúzia). E eu não estou concordando com os místicos paranormais que têm por aí. Até o fim desse post você estará convencido de que são seis... ou não.

Não, nem todos podem ver gente morta. Não é a aura, não é o espírito, não é visão do futuro.

O sexto sentido é o equilíbrio.

— Hã? Só isso? — diriam uns.

Como assim só isso, rapaz? Nada mais banal, revelador e imprecindível que o equilíbrio. Já imaginou sua vida sem ele? Ah, os bebuns que sabem como é. Não poderíamos ser chamados de bípedes sem ele. Toda a orientação espacial que temos está ligada a esse pequeno labirinto membranoso dentro do osso da têmpora.

Seria pretenção minha querer explicar como funciona o equilíbrio, porém segue aqui um pequeno resumo para não dizer que eu não falei das flores.

A função do equilíbrio é gerada a partir de um órgão no ouvido, mas não é totalmente restrita a ele. Essa sensação direcional que sentimos é uma resultante e está relacionada a três sistemas:

O Sistema de Entrada Visual

Nós recebemos muita informação sobre o que nos rodeia a partir do que vemos. Quando estamos desequilibrados nos baseamos muito na imagem para nos orientarmos.

O Sistema Proprioceptivo

Receptores nos pés e nas juntas e também no pescoço nos fornecem informações sobre como o corpo está se movendo e se estamos em chão firme.

O Sistema Vestibular

Calma, não se assuste, já passou... você já está na faculdade... isso... calma... respira. Ufa. O sistema vestibular é o órgão do equilíbrio que está localizado no ouvido interno. O caracol está ligado à audição. Os canais semicirculares estão ligados ao equilíbrio. Claro que há detalhes muito mais complexos que minha ignorância não permite descrever, mas se quiser saber mais leia essa página [BioCiência.org]. Cada um deles está disposto direcionalmente de forma a interpretar cada uma das três "dimensões" do espaço. Ou seja, um está horizontal, o outro está vertical e o terceiro está vertical também, porém transversal em relação ao segundo. Não entendeu? É simples, eles estão estruturados de forma a poder sentir o posicionamento da sua cabeça nos três planos espaciais.

Feche os olhos de uma pessoa e vire-a de todo jeito e depois pergunte para onde é o chão (não tente isso em casa). Se ela souber que o chão fica sempre para baixo com certeza vai acertar. O equilíbrio sempre garante que saibamos para onde o santo ajuda, estejamos sendo girados horizontalmente, verticalmente ou transversalmente.

Isso dá pano pra manga de uma discussão exposta por Edgar Morin em seu livro A Cabeça Bem Feita, a retroação do ser humano como ser biológico e como ser cultural. A partir da constituição do ouvido podemos compreender que o ser humano não é apenas culturalmente capaz de perceber as três dimensões (através do pensamento e da filosofia) é também biologicamente capaz de sentí-las. Por outro lado, só nos percebemos seres biológicos com todos os nossos aparatos quando nos estudamos, o que já configura uma construção cultural. Ou seja, o ser cultural pensa o ser biológico, que por sua vez permite a plena existência e capacidade do ser cultural. O ser cultural não é uma coisa abstrata e nem o ser biológico é um amontoado de carne.

Voltando ao sexto sentido: É por causa desses canais que quando você dá um tapa em uma pessoa na orelha, mesmo que fraco, ela tende a cambalear. Isso porque, por um momento, os canais semicirculares do ouvido que foi atingido vão vibrar por causa da força do impacto, bagunçando e agitando a endolinfa (líquido que estimulas as células sensoriais e que serve de referência para a mudança de posição), o que faz o cérebro fazer uma medição errada, logo, cambaleamos por falta de orientação. O outro ouvido tende a compensar evitando que a pessoa caia. Bata nas duas orelhas e a pessoa irá ao chão (não tente isso em casa).

Quando sua cabeça muda de ângulo em relação à superfície da Terra, a endolinfa mudará para o ângulo oposto, estimulando as células sensoriais e avisando que você (seu eixo de equilíbrio, cada pessoa tem o seu) não está alinhado com a direção da força da gravidade, na posição ideal que o faz ficar de pé, correndo o risco de cair. Esses três sistemas trabalhando em conjunto, de forma complexa, enviando um fluxo contínuo de avisos ao cérebro e à medula espinhal acabam nos dando noção de posição do corpo inteiro, embora a posição da cabeça seja a mais perceptível e precisa por causa do sistema vestibular. Já notou como temos a tendência a sempre deixar a cabeça em posição vertical? Toda pessoa quando aprende a andar desenvolve a percepção de seu próprio eixo para usá-lo como ponto ideal e tudo que estiver fora disso o equilíbrio irá alertar o cérebro de que algo precisa ser feito.

Vale lembrar: o equilíbrio não é uma bússola que aponta para o centro da Terra. É apenas um sentido que capta a aceleração do seu corpo e a usa para determinar seu posicionamento e a mudança dele.

Importante salientar: aceleração.

Fisicamente, não há diferença entre um corpo em repouso e um corpo em velocidade constante. Você está dirigindo um carro em altíssima velocidade, porém constante. Se fechar os olhos, sua sensação será de total imobilidade (não tente isso em casa). Se não fosse assim, ficaríamos malucos ao sentir a absurda velocidade de rotação do planeta, que, ainda bem, é constante.

Agora, porque o equilíbrio não foi reconhecido antes como sexto sentido? Principalmente por sua condição estrutural. Ele praticamente divide o aparato neural com a audição e é auxiliado em parte pela visão e pelo tato. Não podemos esquecer também que a recíproca também acontece com todos os sentidos entre si, se tratarmos como um sistema complexo, já que o corpo humano não é apenas uma receita de bolo cheia de carbono, enxofre e oxigênio como pensa o alquimista Edward Elric (do anime Full Metal Alchemist) ou um amontoado de braços, tripas e cicatrizes como em Frankstein. Não podemos conhecer o todo sem conhecer as partes, mas também não podemos conhecer as partes sem conhecer o todo, como já diria Pascal.

Já notamos anteriormente que a visão contribui para o equilíbrio e que o equilíbrio contribui para a percepção visual das três dimensões. A audição está ligada ao equilíbrio porque estão localizados na mesma região. O tato, através do sistema proprioceptivo, também contribui para nossa sensação de orientação e peso. Por sua vez, o tato enriquece a visão dando-nos idéia de textura associada às sombras de uma superfície. Daí podem vir infinitas combinações só para exemplificar que temos na verdade um complexo sistema sensorial (biológico) e que por ele passa e se baseia nossa percepção de realidade (cultural). O que sentimos na verdade é a resultante da ação conjunta de todos os nossos sentidos. Isoladamente e separadamente duvido que eles sejam tão úteis, preciosos e significantes quanto seu conjunto.

Se você se centra em uma maçã na árvore, você pode ver seu formato, sua cor vermelha, sentir seu cheiro, pode compreender sua posição no espaço, pode ouvi-la cair na sua cabeça e mesmo perceber antes que ela caia o lugar exato onde irá cair, pode tocá-la, comprovar sua textura lisa, sentir seu volume, seu peso, depois seu sabor ao mordê-la. Se um dos seis sentidos faltasse, a realidade que percebemos seria modificada drasticamente, pois todos os outros sentidos seriam de alguma forma comprometidos, uns mais que outros, pois estão todos interligados, trabalhando juntos, não dependentes, mas aliados e, como diria Edgar Morin, complexos.

Sobre o sétimo sentido? Isso para mim é um mistério.

5 comentários:

A Pig disse...

Avuxe!!!

Minhanossasenhora Ce huauhahuahauhuhaa

adorei serioh...eh eu tneho sexto setimo oita sentido....

mas gostei bastante tah engraçado divertido....leve e ao mesmo tempo informativo....adorei a parte do vestiba...comco se agente tivesse estudado horrores huahuahuahuauhahua
*cof**cof**cof**cof*
abafa abafa abada

Anônimo disse...

Excelente post! Realmente complexo, misturando as teorias de Edgar Morin, conceitos biológicos, físicos, filosóficos e o humor e a falta de noção (no bom sentido) típicos de Cecília do Lago.
Parábens!

Pedro Zambarda disse...

Conclusão: Sétimo Sentido, ai sim, é coisa pros Cavaleiros do Zodíacos.

Enfim, mongolices à parte, fiquei boquiaberto com o post. Não sei expressar o quanto de satisfação senti ao ler um texto recheado de bom humor, conteúdo construtivo e interação. Excelente exercício de leitura, Ciça! =D

Pedro Zambarda disse...

*Cavaleiros do Zodíaco

Unknown disse...

AMEI!!!!!!!!!!!

EU TENHO SEXTO SENTIDO, E TB O QUE CHAMAM DE TERCEIRA VISÃO.
FOI ÓTIMO LER UM TEXTO LEVE, INTELIGENTE E DIVERTIDO, E PRINCIPALMENTE, UM TEXTO QUE EXPLICA DE UMA FORMA ORIGINAL QUE PESSOAS COMO NÓS, SÃO PESSOAS COMUNS AOS OLHOS DE UMA SOCIEDADE PRECONCEITUOSA.