domingo, 8 de julho de 2007

O quarto saber: a reportagem como contato humano

"O que agrava a dificuldade de conhecer nosso mundo é o modo de pensar que atrofiou em nós, em vez de desenvolver, a aptidão de contextualizar e de globalizar, uma vez que as exigencias da era planetária é pensar sua totalidade, sua relação todo-partes."

De Edgar Morin, sobre o quarto saber, Ensinar a Identidade Humana.

"A revista Brasileiros, projeto dos jornalistas Hélio Campos Mello, Nirlando Beirão e Ricardo Kotscho, chegou às bancas no dia 4 de julho. A publicação quer seguir o modelo da Realidade, marco da imprensa do país que circulou entre 1966 e 1976."

Fonte: http://www.facasper.com.br/jo/notas.php?id_nota=414

Comprei um exemplar dela. A diagramação teve um trabalho exemplar, com um design muito agradável em comparação à inúmeras publicações da Abril, ou outras editoras de renome. É interessante que o periódico não assume, ou pretende não assumir, nenhum lado de disputa política em suas matérias, pelo menos por enquanto, buscando prioridade em reportagens. É uma boa opção de revista, além da irreverente revista Piauí, de João Moreira Salles, um outro lançamento de 2006.

Entretanto, alerto desde já que os textos da revista Brasileiros são enormes, com muitos relatos seguidos com necessidade de tempo pra leitura. Tem 130 páginas. Embora o volume de texto não seja atraente, o fato de trazer como prioridade as reportagens a torna um orgão que retrata com mais fidelidade o ser humano, como propõe Morin em seu saber.

Temos, como exemplos dessa "identidade humana", citações da reportagem de capa O preconceito sai do armário: "Não gosto de nordestino. Porque vem para o sul sem estrutura. Chega aqui com cinco filhos, fora os cinco que deixou lá. Depois traz os de lá e faz mais cinco aqui. E o Estado é obrigado a dar transporte, educação, saúde", disse um funcionário público negro de 37 anos, chamado Mário, à revista.

A citação, além de abranger com mais integridade o assunto, cobre qualquer interpretação feita pelo jornalista ou articulista. O trabalho jornalístico, tanto como meta da revista como o visto em suas matérias, consiste em organizar as declarações, fazer as perguntas certas com pessoas de diversas opiniões, buscando na raiz da entrevista a "evolução" para o jornalismo. Como diz o cineasta Hector Babenco, em carta sobre a "edição 0" da revista Brasileiros, "é sempre um motivo de orgulho ver um profissional da sua estirpe se reinventar. É isso que mantém o homem vivo, a vontade de não parar de crescer".

Faço uso de um epígrafe que Morin citou em seu livro, sem intrometer, despreparado, qualquer julgamento meu:

"Apenas o sábio mantém o todo constantemente na mente, jamais esquece o mundo, pensa e age em relação ao cosmo."

De Groethuysen.

"A unidade, a mestiçagem e a diversidade devem-se desenvolver contra a homogenização e o fechamento."

Esta citação é, novamente, de Edgar Morin, para concluir essa postagem.


4 comentários:

Cecília do Lago disse...

Parabéns Pedro!!!
O preconceito é uma das piores forças contra a identidade humana.
Em nosso estado é muito forte o preconceito contra nordestinos (como se todos os estados daquela região fossem idênticos), chega a beirar o xenofobismo.
Acredito que isso seja agravado pelo fato de não existir uma identidade brasileira sólida o que faz com que as pessoas se fechem em suas localidades e sejam intolerantes com quem vem de fora (o que por si só já é incorreto pois estamos dentro do mesmo país). Ainda mais difícil do que isso é fazer as pessoas pensarem numa identidade sulamericana, ou mais ainda, global.

Anônimo disse...

Lendo pelo comentário acima, acrescento que a intolerância também agrava esse preconceito, nos achamos no direito de ser superiores por alguns fatores que diferenciam as nossas culturas. É errado sim o preconceito, acabamos julgando uma raça por alguns indivíduos dela. Por esse e outros fatores que muitas vezes não caminhamos como o desejado, infelizmente.

Pedro Zambarda disse...

Sim e, tão importante quanto o que representa a declaração, é o fato de, finalmente, uma revista mostrar isso sem encaminhar nossa interpretação.

O post quer dizer mais ou menos isso. Nos leva a fazer "ligação" que falta entre muitos jornais e periódicos e o mundo real.

Anônimo disse...

Não só aqui no Brasil existe preconceito.

Mas o mais gozado é a ideologia politicamente correta de transformar o preconceito em crime - uma atitude preconceituosa com os preconceituosos.

Criminalizar o preconceito não é a solução, mas o mundo adora o big stick...

Deveria ser feito é um trabalho mais profundo com relação ao preconceito para fazer as pessoas entenderem e aceitarem a pluralidade de modo natural.