segunda-feira, 6 de agosto de 2007

O quinto saber: incerta sociedade mundial

Apresentação de junho feito pela equipe do blog U-tópico, o seminário do livro Utopia, do inglês Thomas More, mostrou muito bem os pontos principais da trama, com minúncias do relato de Rafael Hitlodeu, um visitante da ilha de Utopia. Com a intenção de montar uma sociedade oposta ao capitalismo vigente na época (não se sabe se foi para satirizar ou realmente criticar) More mostrou que os ideais de igualdade social e organização auto-suficiente não foram exclusividade das doutrinas socialistas e comunistas que surgiriam anos depois. Politicamente rico, o livro fez com que o grupo adentrasse em sua filosofia e sugerisse a pergunta "qual é a melhor sociedade, dentro de um sistema, na sua opinião"?

"Dessa forma, a realidade não é facilmente legível. As idéias e teorias não refletem, mas traduzem a realidade, que podem traduzir de maneira errônea. Nossa realidade não é outro senão nossa idéia de realidade."

Essa citação de Edgar Morin sobre a apreensão da realidade aumenta ainda mais a validade dessa pergunta. Não necessitamos, o tempo todo, estar com as idéias sociais presas num pensamento de capitalismo ou socialismo, pois, mesmo atuais, elas podem ser errôneas. As impressões pessoais e a capacidade de pensar alternativas, podem ser alguns métodos contra essas dúvidas políticas que guiam o destino dos indivíduos. Entretanto, não basta só criatividade, cabendo a observação dos fatos mais agravantes como fundamentais para conclusões, evitando equívocos, até mesmo os mais inocentes.

"O século XX descobriu a perda do futuro, ou seja, sua imprevisibilidade."
O que seria, então, pensar um sistema social, uma organização humana, em tempos como o nosso, o século XXI, herdeiro eleito dessa verdade contida no trecho. A era da bomba atômica, do efeito estufa (recentemente transformado no termo "aquecimento global"), da globalização, das guerras frias e quentes não poderia gerar outra constatação a não ser esta. O mundo de buscas utópicas como o livro de Thomas More não podem ser uma resposta à altura de nossos tempos, pois ele foi preenchido pelas incertezas que já rondavam a humanidade, adormecidas.

Um livro contemporâneo que pode ser comparado com Utopia é 1984, do escritor indiano George Orwell (Eric Arthur Blair), que narra uma futura sociedade dominada por um enorme conglomerado chamado somente de O Partido, manifestado na figura de um lider chamado de Big Brother, que domina o megabloco da Oceania, que agrega muito mais do que esse continente real, com as Américas, Reino Unido e Sul da África.

Winston Smith, um funcionário Ministério da Verdade, na ficção, é um manipulador de informações. Ao invés de sugerir um novo sistema, Orwell critica pelos olhos de Smith os abusos cometidos no século XX até 1948, ano do lançamento desse livro. Proibidos de escrever para não registrar idéias, os cidadãos da história são vigiados constantemente por "teletelas" (mistura de telefone com tela de visualização). Ao ter nas suas mãos o lápis, Smith inicia um processo contra as manipulações feita pelo partido, enfrentando a incerteza de haver algo errado em sua sociedade. Uma mulher que o persegue, chamada Júlia, se sente atraída por ele e passa a auxiliá-lo em sua busca sem nenhum destino definido, além da tortura e manipulação se forem descobertos pelo Partido.

Orwell, retrata com essa busca as "entranhas" dos regimes totalitários, sobretudo o socialista soviético de Stalin, que o decepcionou em sua trajetória. O fim, um tom pessimista sobressai, tendo Winston e Júlia com suas consciências lavadas. A mesma crítica social de Thomas More é tratada por Orwell pelo viés da "sociedade cruel". E nesse contexto, não podemos estabelecer com precisão uma sociedade perfeita.

Somos como o Winston de Orwell e o Hitlodeu de More. Estamos descobrindo novas formas por nossas impressões. Podemos ter nossos ideais levados pela manipulação social. Vivemos na incerteza que Edgar Morin trata em especial nesse quinto saber, enfrentar as incertezas. E qual incerteza não seria maior que a sociedade, com sua história "criadora e destruidora" e as previsões a longo prazo insuficientes?

"Há efetivamente dois meios para enfrentar a incerteza da ação. O primeiro é totalmente consciente da aposta contida na decisão, o segundo recorre à estratégia.
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A estratégia deve prevalecer sobre o programa. O programa estabelece uma seqüência de ações que devem ser executadas sem variação em um ambiente estável, mas se houver modificações das condições externas, bloqueia-se o programa. A estratégia, ao contrário, elabora um cenário de ação que examina as certezas e as incertezas da situação, as probabilidades, as improbabilidades. O cenário pode e deve ser modificado de acordo com as informações recolhidas, os acasos, os contratempos ou boas oportunidades encontradas no caminho."

Esses trechos não respondem tal pergunta, mas dissecam melhor a questão.

Observação: O Big Brother (ou Grande Irmão) da ficção de George Orwell inspirou o reality-show internacional apresentado na Rede Globo de Televisão.

Agradecimentos a Marília Passos pela sugestão da comparação entre 1984 e Utopia.

4 comentários:

Anônimo disse...

É duro lidar com as incertezas, mas pelo que o próprio texto diz, entendo que ele passa a mensagem de estar sempre preparado para o futuro incerto. Mesmo que não possamos saber o que nos aguarda, é preciso pelo menos ter vários caminhos a se tomar, isso é o básico da estratégia e com certeza, combina muito com nosso mundo atual.

No começo do texto, é citado o aquecimento global, aquecimento esse, que ouvimos falar quase que diariamente na TV, ou noticiado em jornais. É um exemplo de uma previsão em que sabemos como agir, mas, na maioria das vezes, agimos de modo diferente. Penso que mais pelo egoísmo do homem pela vida do próximo, do que a incerteza do que estará nos esperando no futuro.

Anônimo disse...

Já dizia Heisenberg quando enunciou seu Princípio da Incerteza (na Física).

Acho que já está na hora da dialética entrar em ação e as pessoas abandonarem a idéia de que só pode existir capitalismo ou socialismo...

Magda C Kaspary disse...

Caro,
de que livro do Morin é a citacao trazida neste texto? Obrigada.

Unknown disse...

Trata-se do Livro "Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro"